sábado, 15 de março de 2008

Lula anuncia verba para universidades federais

CORREIO DO POVO
PORTO ALEGRE, SEXTA-FEIRA, 14 DE MARÇO DE 2008
O repasse do Reuni prevê metas e compromissos

Os 53 reitores das universidades federais que aderiram ao Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) foram ontem recebidos pelo presidente Lula, no Palácio do Planalto. No encontro, Lula anunciou verbas para a Educação Superior no país, por meio do Reuni, que prevê investir, até 2012, R$ 2 bilhões para que as instituições (Ifes) abram cursos e vagas; promovam melhorias de infra-estrutura, acesso, permanência de alunos e qualidade do Ensino. Para essa expansão serão também criados 23.930 cargos nas universidades federais (13.276 para professores; e 10.654 a técnicos-administrat ivos).
O Reuni, que integra o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), efetiva a 2ª etapa da expansão das Ifes, com aporte de recursos para qualificar ações. O primeiro repasse, de R$ 250 milhões, ocorreu em dezembro/2007. Na fase inicial, foram criadas dez universidades federais e abertos 61 campi no país. Para receber os recursos nos próximos cinco anos, as universidades precisam especificar o que farão; e assumir os compromissos de elevar para 90% a taxa de concluintes nos cursos presenciais de graduação e aumentar para 18 o número de alunos por professor (hoje, a média é de 12 alunos). As Ifes devem, ainda, alcançar pelo menos cinco objetivos: aumentar número de vagas, ampliar ou abrir cursos noturnos, reduzir o custo por aluno, flexibilizar os currículos e combater a evasão escolar.
As licenciaturas, que formam professores para a Educação Básica, integram o compromisso do Reuni, pois faltam 246 mil docentes. Hoje, as Ifes oferecem 931 licenciaturas. Em 2012, devem atingir 1.198. E as vagas precisam subir, de 49.551 (2008) para 71.191 (2012).

quinta-feira, 6 de março de 2008

Jovens da América do Sul: situações, demandas e sonhos mobilizados

Eliane Ribeiro* e Regina Novaes**
A América do Sul vive intensas transformações sociais, culturais, políticas
e econômicas. A despeito das diferenças que caracterizam a formação
social de nossos países, cada vez mais se evidenciam semelhanças
marcadas pela combinação de histórias comuns de governos autoritários,
dificuldades de processar transições democráticas, perversos efeitos de
políticas neoliberais econômica e socialmente desagregadoras, um persistente
quadro de precariedades e desigualdades sociais.
Jovens da América do Sul:
situações,
demandas
e sonhos
mobilizados
4 DEMOCRACIA VIVA Nº 38
A R T I G O
Ao mesmo tempo, em vários países registram-
se esforços significativos em direção
da consolidação da democracia. Diferentes
formas de participação, associativismo e redes
sociais estão presentes no espaço público e
impulsionam iniciativas governamentais em
direção à ampliação de direitos sociais e à
geração de oportunidades.
Nesse contexto, em que se combinam
velhas vulnerabilidades e novas possibilidades
de agregação social, observa-se a importância
de um particular segmento populacional:
a juventude. Vivemos o apogeu da quantidade
de jovens com relação ao total da população
da região, entre 20% e 25%, quadro que deve
permanecer pelo menos até 2015.
Habitantes de um mundo em acelerado
processo de globalização, esses(as) jovens
vivenciam problemas e incertezas semelhantes.
Costuma-se dizer que as novas gerações são as
maiores vítimas das excludentes injunções que
caracterizam o continente sul-americano. Porém,
se já não há como negar as possibilidades
construídas pelos próprios jovens, que direta
ou indiretamente, funcionam como enfrentamento
e resposta às situações de discriminações
e desigualdades, trata-se de melhor conhecê-las.
Este é o objetivo da pesquisa Juventude e Integração
Sul-americana: caracterização de situações-
tipo e organizações juvenis.1
Como ponto de partida, indagou-se:
qual o papel da juventude nas mudanças em
curso em nosso continente? Que demandas,
lutas políticas, formas de organização e de solidariedade
esses(as) jovens têm construído no
início deste novo século? Seria possível falar em
identidade geracional e uma agenda comum
para ação entre jovens sul-americanos?
Com essa perspectiva, o estudo foi centrado
na análise de 19 situações-tipo, cada uma
focalizando um segmento juvenil do qual nos
aproximamos com um mesmo conjunto de
questões, enfatizando a aposta na juventude
e a identificação de suas principais demandas.
Aproximando juventudes
Após nove meses de trabalho, foi possível
conhecer um conjunto de processos em movimento,
identificar demandas e estratégias focalizadas
pelos(as) jovens no sentido da ampliação
de conquistas políticas e sociais (Tabela 1).
Tabela I
Sistematização das situações-tipo estudadas
País/Instituição Segmento Organização ou Demanda/
parceira juvenil grupo pesquisado Consigna
Argentina / Filhos de desaparecidos H.I.J.O.S./ Buenos Aires Direitos humanos
Fundação SES políticos da ditadura militar (Direito à verdade, justiça
1976-1983 (setores médios) e memória histórica)
Jovens da cidade de Assembléia Juvenil Proteção ao meio-ambiente
Gualeguaychú Ambiental de
(setores médios) Gualeguaychú
Jovens desempregados Jóvenes de Pie, na Trabalho (oportunidade de
(setores populares) província de emprego ou inserção produtiva)
Buenos Aires e educação
Jovens beneficiários Movimento Juvenil Trabalho (capacitação para
de projetos sociais Andresito (Província de inserção produtiva) e educação
(setores populares) Misiones)
Bolívia / PIEB Jovens do movimento Grupos de hip hop Cultura (reconhecimento
hip hop (bairros populares) aymará em El Alto etnocultural e condições para
produção artística), educação
e trabalho
Jovens estudantes Movimentos estudantis em Educação (movimento pela
moradores de bairro popular El Alto (Antonio Paredes criação de uma Escola Normal
(setores populares) Candía, Insea, Insthea) em El Alto)
Jovens empregadas Federação Nacional das Trabalho (direitos trabalhistas/
domésticas Trabalhadoras do Lar eqüidade de gênero) e educação
(setores populares) em La Paz
1 Pesquisa realizada pelo
Ibase em parceria com
o Instituto Pólis – Estudos,
Formação e Assessoria em
Políticas Sociais, com apoio
do International
Development Research
Centre (IDRC) e mais um
conjunto de entidades e
pesquisadores(as) dos países
envolvidos.
(Continua na página seguinte)
MARÇO 2008 5
JOVENS DA AMÉRICA DO SUL: SITUAÇÕES, DEMANDAS E SONHOS MOBILIZADOS
País/Instituição Segmento Organização ou Demanda/
parceira juvenil grupo pesquisado Consigna
Brasil / Pólis Jovens migrantes que Jovens do Nordeste Trabalho decente (melhores
(a partir de rede de trabalham no corte manual (Maranhão e Piauí) que condições) e educação
pesquisadores/ da cana-de-açúcar (famílias trabalham no interior (calendário escolar adequado)
instituições no Brasil) de agricultores pobres) de São Paulo
Jovens estudantes urbanos Movimento pelo passe livre Circulação (locomoção para
(maioria de classes populares, – Revolta do Buzu – em a escola / transporte / direito à
alguns de classe média) Salvador/Bahia cidade) e educação de qualidade
Jovens trabalhadores do Sindicato dos Trabalhadores Trabalho decente
setor de telemarketing em Empresas de (melhores condições)
(sobretudo, setores Telecomunicações no Estado
populares, minoria de de São Paulo e Sindicato
classe média) dos Trabalhadores em
Telemarketing e Empregados
em Empresas de Telemarketing
na Grande São Paulo
Jovens do movimento Grupo Família MBJ, em Cultura (condições para
hip hop (bairros populares) Caruaru / Pernambuco produção artística e cultural,
luta por reconhecimento
e combate ao racismo)
Jovens de projetos sociais Fórum de Juventudes Políticas públicas de juventude
e organizações voltadas do Rio de Janeiro (participação na agenda,
para jovens (maioria de na elaboração e no
setores populares) acompanhamento)
Segmentos juvenis Acampamento Sustentabilidade, economia
diferenciados (movimentos Intercontinental da solidária, direitos humanos,
culturais, pastorais, Juventude – Fórum Social diversidade e igualdade: por um
estudantis, jovens de ONGs, Mundial (edições realizadas outro mundo possível
de partidos políticos etc) em Porto Alegre) (influenciar na agenda e nas
formas de participação do
Fórum Social Mundial e nas
pautas das juventudes)
Chile / CIDPA Jovens estudantes Movimento de protesto dos Educação (demandas imediatas
secundaristas (maioria secundaristas, Rebelião dos e de projeto educacional)
setores populares, alguma Pingüins, em Valparaíso –
participação setores médios) Coordenadora de Estudantes
Secundaristas de Valparaíso
Segmentos juvenis Organizações juvenis que Políticas públicas para a juventude
diferenciados que participam no Departamento (participação ativa na definição
participam de projetos de Jovens de Concepción e gestão dessas políticas)
Paraguai / Base–IS Jovens camponeses em Associação de Agricultores Agroecologia (terra,
região de crescimento da do Alto Paraná (Asagrapa) educação, trabalho)
monocultura da soja
Jovens estudantes Movimento do passe livre Educação, circulação /
secundaristas (maioria Federação Nacional de transporte
setores populares e Estudantes Secundaristas
parte setores médios) (Fenaes) – Assunção
Uruguai / Cotidiano Juventudes partidárias Grupos jovens do Partido Participação política (as ênfases
Mujer / Faculdade Colorado, Partido Nacional nas agendas correspondem ao
de Ciências Sociais da e da Frente Ampla perfil dos diferentes partidos)
Universidade República (Montevidéu)
Movimento pela Plantá tu Planta, Prolegal, Legalização da maconha
Legalização da La Placita (direito de escolher, cultura,
Cannabis meio-ambiente)
Fonte: Juventude e Integração Sul-americana: caracterização de situações-tipo e organizações juvenis, 2008.
(Continuação da Tabela 1)
6 DEMOCRACIA VIVA Nº 38
O que reivindicam?
Observando a Tabela 1, destacamos
seis pontos de intercessão que – sem
desconhecer as especificidades das diferentes
situações estudadas – podem
favorecer a construção de uma agenda
comum.
Educação pública de qualidade:
uma escola que caiba na vida
do(a) jovem
A demanda mais presente nos segmentos
juvenis estudados foi a educacional.
Destaca-se o reclamo por educação pública,
gratuita e de qualidade. Nas entrevistas
realizadas, está presente o tom de
denúncia que enfatiza as práticas discriminatórias,
os processos de exclusão,
os mecanismos de reprodução de desigualdades
que caracterizam o sistema
educacional dos diferentes países. Contudo,
chamou a atenção o fato de que
não se fala apenas em direito à educação
ou ampliação do acesso à escola.
Para essa geração, trata-se de buscar:
maior qualidade (professores mais bempreparados,
currículos mais condizentes
com a realidade atual); mais flexibilidade
(necessidade de calendários adaptados
para combinar trabalho e estudo
nas cidades e na área rural); garantia
de continuidade educativa (secundária,
técnico-profissional, universitária).
Trabalho decente e outras
oportunidades de
inserção produtiva
A questão do trabalho está presente de
forma contundente, evidenciando centralidade
na vida dos(as) diversos(as)
jovens sul-americanos(as). Diante da
precarização das condições trabalhistas,
do desemprego, da concentração
fundiária, da mecanização, das mudanças
tecnológicas e das discriminações
ditadas pelo fato de serem jovens, as
pessoas entrevistadas buscam oportunidades
para trabalhar e se emancipar.
Como se pode deduzir pelo que mostra
a Tabela 1, as trajetórias dessas pessoas
no mundo do trabalho são diversas.
No entanto, destacam-se duas quimeras
recorrentes. Em primeiro lugar, não
demandam simplesmente trabalho, mas
trabalho decente que assegure remuneração
condizente e direitos trabalhistas.
Em segundo lugar, enfatizam
novas ocupações na área da cultura, da
agroecologia, das ocupações sociais que
permitem aliar inserção produtiva (individual
ou em grupo) e valores.
Cultura: valores e acessos à
fruição e à produção cultura
Com diferentes ênfases e matizes, a dimensão
cultural está presente em todas
as situações-tipo estudadas. Considerando
que em nossas sociedades a juventude
está sempre entre forças antagônicas
que produzem tanto adesões
como críticas à chamada sociedade de
consumo, em cada uma das situações
estudadas estão presentes disputas de
imagens, valores, motivações de sentido
de vida. Nesses cenários, por um lado, o
acesso à cultura começa a ser visto como
um direito dos(as) jovens os quais, geralmente,
não têm recursos para escolher
como usar o tempo livre, para desfrutar
os momentos de lazer e para ter
acesso ao patrimônio cultural material
e imaterial de seu país. Por outro lado,
nessa geração ampliou-se significativamente
o número de jovens voltados(as)
para produções artísticas geradoras de
pertencimentos e identidades. Dessa
forma, convocam-se os poderes públicos
tanto para garantir meios para lazer e
fruição cultural para diferentes segmentos
juvenis como para o reconhecimento
e o apoio às diferentes manifestações
artísticas produzidas e apreciadas
pela juventude.
Vida segura: valorização da
diversidade e direitos humanos
Essa geração de jovens sul-americanos(
as) é afetada por diferentes formas
de violência física e simbólica.
Uma das dimensões estudadas está relacionada
ao direito à memória negada
pela violência política do regime militar.
Em outras distintas situações estudadas,
segmentos juvenis socialmente vulnerabilizados
dirigem-se ao poder público
para reverter preconceitos e discriminações
(étnicas, de gênero, por local de
moradia). Em parte delas, menciona-se
a opressão advinda dos confrontos entre
o tráfico de drogas e as polícias que,
em geral, tratam os jovens como principais
suspeitos. Como ponto comum,
amplia-se a referência aos direitos humanos,
reforçando a necessidade de
que políticas públicas de juventude que
contemplem: a) a busca de justiça e dos
direitos de cidadania; b) o combate aos
preconceitos e a valorização da diversidade
cultural juvenil; c) uma concepção
de vida segura que articule o combate à
violência com os demais eixos da agenda
pública de juventude (educação, trabalho
e cultura).
Ecologia: conexões juvenis
com vistas à sustentalibidade
socioambiental
Pelo caminho da ecologia, jovens da cidade
e do campo se conectam com as
questões de seu tempo, fazendo dialogar
velhos problemas com novas motivações.
Nas situações-tipo estudadas,
registram-se diferenciadas evocações da
questão ambiental e ecológica. Daí resultam
tipos diversos de ações coletivas e
inéditas possibilidades de articulação
intergeracional e entre jovens de classes
sociais diferentes, urbanos e rurais.
Considerando que a pauta do meio-ambiente
está bastante disseminada, recomenda-
se a ampliação da noção de educação
ambiental formal e não-formal,
favorecendo a circulação de informações
e proporcionando elementos para negociação,
escolhas e pactos societários.
Em momento em que se esgotam oportunidades
nas carreiras tradicionais e há
tanta preocupação sobre o futuro do
planeta, tal perspectiva também acena
para o fortalecimento de novas áreas de
profissionalização ambiental (agentes
comunitários ambientais, turismo ecológico
etc.) e para espaços de inserção
juvenil na América do Sul.
Circulação: ampliação das
possibilidades de ir e vir
no campo e na cidade
Uma das demandas que aparecem de
forma incisiva na pesquisa é o direito à
circulação e à mobilidade, necessário ao
exercício de outros direitos fundamentais
– como acesso à educação, ao trabalho,
à cultura e ao lazer. O direito à
circulação dos(as) jovens tem sido mote
de algumas das mais expressivas manifestações
públicas na região, com embates
entre jovens, poder público e empresários
do transporte. Podemos dizer
que o direito mais genérico à circulação
e à cidade (no caso da juventude urbana)
não está incorporado nem respondido.
É fundamental desenvolver a consciência
de que a mobilidade juvenil deve ser
iniciativa e resultado de política pública.
A R T I G O
MARÇO 2008 7
Reinvenções da participação
Independentemente da demanda em questão,
movimentos juvenis necessitam de visibilidade,
reconhecimento e participação. É preciso que
a sociedade, e em especial os governos, sejam
capazes de reconhecê-los e de estimular espaços
onde possam dialogar e influenciar nas políticas
que afetam suas vidas. Para tanto, é fundamental
aprofundar conhecimento sobre jovens
da região, relativizar idéias preconcebidas e ampliar
a capacidade de compreensão sociológica.
Os relatórios nacionais da pesquisa nos
permitem questionar, por exemplo, observações
recorrentes sobre a geração juvenil atual.
Costuma-se dizer que os expedientes virtuais,
vinculados às novas tecnologias de informação,
afastam os(as) jovens do mundo real.
Relativizando tal generalização, observamos
que as novas tecnologias de informação e
comunicação (tais como Internet – blogs,
fotologs, páginas pessoais, fóruns de discussão,
celular, entre outras) surgem como importantes
instrumentos de organização, de
registro de atividades, de disseminação das
demandas e mobilização etc. entre jovens
organizados(as).
Por outro lado, elementos destacados
pelos(as) jovens pesquisados(as) nos permitem
questionar veredictos que afirmam não existir
JOVENS DA AMÉRICA DO SUL: SITUAÇÕES, DEMANDAS E SONHOS MOBILIZADOS
MAIS PV MONTAGEM COM FOTO DE SAMUEL TOSTA
8 DEMOCRACIA VIVA Nº 38
utopias entre a juventude de hoje. Certamente,
existem vários usos da palavra em questão.
Porém, por que não considerar utopias (sonhos
mobilizadores) essas inéditas conjugações entre
demandas imediatas e questões mais gerais,
expressas por meio das idéias de direitos humanos
e de ecologia?
Tratar do tema da juventude na região
de forma mais qualificada é fortalecer uma
nova perspectiva comum dos direitos humanos
dos(as) jovens; é potencializar solidariedades
sociais e acesso às novas tecnologias; é influenciar
na construção das agendas de políticas
públicas voltadas para as juventudes regionais
que visem sustentabilidade socioambiental.
Se é verdade que nunca houve uma humanidade
tão numerosa e tão jovem, certamente
caberá à juventude atentar para urgentes ações
no “aqui e agora” e reinventar utopias, doadoras
de sentido para a vida.
Políticas no Mercosul
Iniciadas em momentos diferentes e
com institucionalidades diversas, nos
seis países estudados existem iniciativas
de políticas públicas para a juventude
(PPJ). E como são avaliadas
essas políticas? No conjunto, predominam
observações críticas, tais como: planos
educativos que não levam em conta
a inserção produtiva futura dos(as)
jovens; pouca atenção à cultura; ausência
de programas de acesso à moradia
para jovens; falta de atenção à
saúde da juventude. Evidenciam-se
ainda problemas de desenho e de gestão
das PPJs, a saber: falta de orçamentos
próprios ou orçamentos limitados;
ausência de uma abordagem
integral dos problemas que atingem
os(as) jovens; falta de coordenação
entre ações setoriais e/ou ações territoriais;
ausência de um plano pactuado
com a sociedade; falta de participação
juvenil em seu desenho, implementação
e avaliação.
Ao identificar tensões e dificuldades
das PPJs nestes países, acreditamos
estar contribuindo para que os
problemas possam ser equacionados.
A integração das políticas públicas de
juventude com o Mercosul foi enfatizada
por especialistas, entrevistados(
as) na pesquisa, como um passo
importante nessa direção. Não por
acaso, há uma grande expectativa sobre
o papel que pode ser desempenhado
pela Reunião Especializada da
Juventude (REJ), que se soma a outros
organismos do Mercosul dedicados
às políticas públicas setoriais.
A REJ surgiu na Cúpula de Córdoba,
em 2006, e marcou a introdução do
tema da juventude na agenda oficial
do bloco.
As preocupações que predominam
entre os gestores governamentais
e os movimentos sociais são: levantar
informações sobre as políticas dos
países vizinhos; e homogeneizar estatísticas
e marcos legais – no Brasil, a
categoria “jovem” vai de 15 a 29 anos.
Em outros países, em geral, abarca de
15 a 24 anos. Além disso, há projetos
de desenvolver campanhas transnacionais
contra a exploração sexual de
jovens – problema especialmente
grave nas áreas de fronteira.
Nesse contexto, acredita-se que a
questão da juventude tanto possa ser
impulsionada como impulsionar a integração
sul-americana. Sem dúvida, o
fortalecimento de lideranças juvenis locais
e regionais; a maior vinculação entre
os temas da inclusão e da participação
social com as políticas públicas de juventude;
assim como o maior compromisso
dos poderes públicos com a agenda
dos(as) jovens contribuirão para a consolidação
da democracia regional.
Por outro lado, e simultaneamente,
a aposta e a consolidação de uma integração
solidária entre povos e nações
da região contribuirá para que as demandas
da juventude ganhem visibilidade
na América do Sul, pautem agendas
públicas e gerem novas iniciativas e
mudanças em relação ao futuro das
novas gerações. Os obstáculos são bem
conhecidos. Mas nesse inédito e desafiante
processo de integração, surpresas
e esperanças têm surgido entre os(as)
jovens. Cabe aos governos e à sociedade
encontrar os melhores meios para que
a energia vital da juventude se espalhe
por todo tecido social.
Atualmente, no âmbito do Mercosul, o
espaço reservado à participação da juventude
ainda é pequeno. Não tem sido fácil para os
distintos participantes de movimentos juvenis
conseguir se articular na esfera regional,
pois a tendência é que as mobilizações se
dêem, sobretudo, nos planos locais e nacionais.
No entanto, os processos em curso têm
mostrado que a participação de jovens nos
assuntos públicos é fator determinante para
a ampliação da democracia na região.
Nessa perspectiva, o Mercosul se torna,
portanto, um novo marco para um diálogo
em que haja explicitação de conflitos e trocas
entre os atores sociais participantes.
Demandas e participação juvenis que, à primeira
vista, não estariam ligadas aos processos
formais de integração regional, ganham relevância
hoje: podem (e devem) ser abordadas
sob a ótica regional.
A R T I G O
MARÇO 2008 9
* Eliane Ribeiro
Cientista social,
doutora em Educação,
integrante da Equipe
Técnica Sul-americana
da pesquisa
** Regina Novaes
Antropóloga,
consultora temática
da pesquisa
Trabalhar em rede é, sem dúvida, um
grande desafio. Com base na experiência
bem-sucedida da pesquisa Juventude Brasileira
e Democracia: participação, esferas
e políticas públicas (2004-2005), que
envolveu instituições de diversas regiões
do Brasil, Ibase e Pólis avançaram na produção
de novos conhecimentos sobre o
universo juvenil, agora com o olhar voltado
para o continente sul-americano.
Este novo estudo, realizado a partir de
uma rede de organizações e de pesquisadores(
as) de seis países da região, reforça
a nossa convicção sobre o acerto desse
desenho organizacional.
No Brasil, o Pólis, coordenador dos
estudos nacionais, organizou uma rede
integrada por alguns parceiros da pesquisa
anterior – tais como Universidade
Federal Fluminense, Universidade Federal
do Rio Grande do Sul e Ação Educativa,
ONG sediada em São Paulo – e por especialistas
nas temáticas abordadas. Com a
supervisão técnica de Helena Abramo, somamos
forças na articulação de parceiros
localizados em vários estados e responsáveis
pelos estudos sobre distintas organizações
e movimentos juvenis, afinando
os enfoques analíticos com vistas à elaboração
de um relatório nacional.
Essa articulação, por si só complexa,
constituiu-se em um dos braços de uma
rede mais ampla, integrada por instituições
desses seis países do continente.
O desafio de executar uma pesquisa em
rede no curto tempo disponível exigiu
habilidade e sintonia da coordenação e
forte comprometimento dos(as) pesquisadores(
as).
A aposta na construção coletiva de
novos saberes, no compartilhamento de
reflexões que transcendem as dinâmicas
específicas de cada país e, sobretudo, na
articulação de instituições sul-americanas
comprometidas com o adensamento da
democracia e com a transformação social
da nossa região gerou resultados positivos
e proporcionou um rico aprendizado
entre as partes.
Esse processo, no entanto, só foi possível
graças ao esforço coletivo em vencer
as barreiras do idioma, à existência
de um diálogo franco e aberto entre nós
e ao compromisso mútuo com os pressupostos
técnicos e políticos do projeto.
Nesse percurso, fomos capazes de flexibilizar
sem perder o foco, criar sinergias
sem aplacar a diversidade, somar o acúmulo
das distintas instituições e, com
isso, alimentar novas reflexões e indagações
que ultrapassam os limites dessa
pesquisa. Concluímos essa trajetória com
a certeza de que as relações de confiança
construídas no decorrer desse período
são valiosas e respondem pelo sucesso
da empreitada.
A parceria entre Ibase e Pólis, iniciada
no projeto anterior, vai se firmando
como exemplo de um feliz encontro entre
instituições que comungam ideais, mas
possuem trajetórias distintas e alguns
campos específicos de atuação. A soma
dos acúmulos institucionais e a concepção
e condução compartilhada das duas
pesquisas sobre juventude reverteram-se
positivamente para os referidos projetos.
O rico intercâmbio de experiências, o
exercício de construção coletiva e os laços
de amizade que nos unem vêm gerando
aprendizados pessoais e para ambas as
organizações.
*Anna Luiza Salles Souto
Coordenadora executiva do Instituto
Pólis, coordenadora geral da pesquisa
no Brasil e coordenadora adjunta da
pesquisa sul-americana
** Pedro Pontual
Pesquisador do Instituto Pólis,
coordenador geral da pesquisa no Brasil
e coordenador adjunto da pesquisa
sul-americana

Conjuve elege presidente e vice-presidente na primeira reunião ordinária de 2008

21/02/2008 - 16:15
A 12ª Reunião Ordinária do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve) terminou na última quarta-feira (20/2), com a eleição dos conselheiros que vão ocupar os cargos de presidente e vice-presidente no biênio 2008/2009. Para presidente, foi escolhido o secretário-adjunto da Secretaria Nacional de Juventude, Danilo Moreira, e para vice-presidente, a representante da entidade de apoio Ação Educativa, Maria Virginia de Freitas (Magi). A última gestão foi presidida pela sociedade civil, tendo o governo na vice-presidência. Danilo Moreira é historiador, foi diretor da União Nacional dos Estudantes (UNE) e participou da elaboração do “Projeto Juventude” do Instituto Cidadania. A Magi é socióloga, mestre em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) e coordena o programa Juventude da Ação Educativa.
Na avaliação do novo presidente, Danilo Moreira, o Conjuve tem grandes desafios pela frente, mas a prioridade nesse momento é envolver o novo colegiado nos debates preparatórios da Conferência Nacional de Juventude, que acontece em Brasília, de 27 a 30 de abril, com o objetivo de ampliar ainda mais a participação e reforçar uma consciência na sociedade e nos governos sobre a necessidade de investimento em políticas públicas de juventude. Para o secretário-executivo do Conjuve, José Eduardo de Andrade, a composição e posse do Conselho significam mais uma etapa para o fortalecimento institucional do colegiado e um reforço na implementação da Política Nacional de Juventude.
Essa foi a primeira reunião ordinária do Conjuve em 2008, que começou com a posse dos novos conselheiros, no dia 18/2, onde estiveram presentes o ministro Luiz Dulci e o secretário nacional de Juventude, Beto Cury. Nos dois dias seguintes (19 e 20/2), os participantes organizaram e discutiram as prioridades das comissões temáticas do colegiado, que incluem marco legal, acompanhamento de programas e políticas, acompanhamento do Prlamento e a Conferência Nacional de Juventude.
Um momento importante do encontro foi a divulgação da pesquisa “Juventude e Integração Sul-Americana: caracterização de situações-tipo e organizações juvenis”, desenvolvida pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e pelo Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais (Polis), e que revela as expectativas dos jovens no Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile e Bolívia. Nos dias 25 e 26 de fevereiro, os dois Institutos realizam, no Rio de Janeiro, o seminário internacional “Juventudes Sul-Americanas: o que há de novo?”, para discutir os resultados da pesquisa, que tem por objetivo contribuir para a formulação de políticas para jovens no âmbito do Mercosul. O evento será realizado no Clube de Engenharia, na avenida Rio Branco, nº 124/22º andar, no centro da capital, e não exige inscrição prévia.
Clique aqui para conhecer a programação.
Saiba Mais – O Conselho Nacional de Juventude (Conjuve) é um espaço de diálogo entre a sociedade civil, o governo e a juventude brasileira. É um órgão consultivo e tem por objetivo assessorar o governo federal na formulação de diretrizes da ação governamental; promover estudos e pesquisas sobre a realidade socioeconômica juvenil; e assegurar que a Política Nacional de Juventude seja conduzida por meio do reconhecimento dos direitos e das capacidades dos jovens, com ampliação da participação cidadã. O Conselho é composto por 20 representantes do poder público e 40 da sociedade civil, entre integrantes de redes, movimentos e organizações juvenis.
Mais InformaçõesAssessoria de ComunicaçãoSecretaria-Geral da Presidência da República(61) 3411.1407

quarta-feira, 5 de março de 2008

Jovens de comunidades tradicionais discutem demandas para conferência nacional

Agência Brasil – 3/3/2008

Yara Aquino
Repórter da Agência Brasil
José Cruz/Abr

Brasília - Adalmir José da Silva fala à Agência Brasil durante a Consulta Nacional aos Povos e Comunidades Tradicionais, que terminou neste domingo e antecede a 1ª Conferência Nacional da Juventude.

Brasília - Após três dias de discussão, jovens de comunidades tradicionais como ciganos, índios, quilombolas e ribeirinhos construíram as demandas que pretendem levar à 1ª Conferência Nacional de Juventude, que será realizada de 27 a 30 de abril, em Brasília.

Muitas reivindicações de jovens de diversos grupos tradicionais giram em torno de temas em comum relacionados à educação, à saúde e ao combate à violência. Mas, em cada área, há necessidades específicas de acordo com diferenças regionais, costumes e crenças.

A educação é citada por representantes de quilombolas, de índios e de terreiros e religiões de matriz africana, por exemplo. Os indígenas querem mais escolas de ensino médio nas aldeias, como explica Júnior Nicário, indígena de Roraima.

“O ensino médio ainda é muito pouco nas áreas indígenas, muitos jovens ficam na comunidade sem fazer nada e poderiam estudar”, disse Nicário, um dos participantes da Consulta Nacional aos Povos e Comunidades Tradicionais, que terminou ontem (2).

Reformular o currículo e inserir temas sobre as comunidades tradicionais, além de cobrar que seja colocado em prática o ensino da história e cultura afro-brasileiras e africanas – cuja obrigatoriedade foi definida em lei de 2003 – estão entre as propostas dos representantes de terreiros e religiões de matriz africana.

Para os quilombolas, o ensino de história e cultura afro-brasileiras e africanas são insuficientes. “Queremos uma educação específica para os povos quilombolas a ser construída por especialistas da educação”, afirma Adalmir José, que vive em uma comunidade quilombola de Pernambuco.

Os jovens de comunidades tradicionais também querem políticas públicas de segurança para conter a violência que atinge a juventude brasileira. “Está acontecendo um verdadeiro extermínio contra a juventude negra, por ser a maioria dessa população que está inserida no contexto da carência econômica das favelas”, avaliou Fábio Gomes, outro participante da consulta.

Um documento final será elaborado com as propostas apresentadas no evento e servirá como subsídio para as discussões da 1ª Conferência Nacional de Juventude.

A expectativa dos participantes é que as necessidades das comunidades tradicionais sejam ouvidas e atendidas. Mas, segundo o quilombola Adalmir José da Silva, há o receio de que em um ambiente mais amplo de discussões os interesses dos jovens urbanos prevaleçam.

Silva explica que as comunidades tradicionais têm mais dificuldade de mobilização porque vivem em localidades afastadas. De acordo com ele, poucos quilombos têm telefone e acesso à internet. “A zona urbana acaba, em alguns casos, sufocando quem vem da zona rural.”



terça-feira, 4 de março de 2008

5º Concurso internacional de redação 2008: "A cidade que sonhamos - a voz dos jovens


Cidade do Cabo, envio até 23 de março de 2008
Em 2007, pela primeira vez na história da humanidade a população mundial concentrada nos centros urbanos ultrapassou a faixa dos 50%. A cidade é normalmente associada a melhores oportunidades, acesso a emprego, educação, saúde e outros serviços. Cidades são vistas como motores do desenvolvimento econômico e centros de inovação e investimentos. Ao mesmo tempo muitas cidades são caracterizadas por seus bolsões de pobreza, com grande parte de seus moradores vivendo em favelas, sem acesso a serviços básicos essenciais e excluídos socialmente. A cada dia mais e mais pessoas nos países em desenvolvimento, particularmente na África e na Ásia, migram do campo para a cidade. Cresce o número de mega-cidades no mundo e surge uma necessidade latente de soluções para enfrentar o problema da pobreza urbana, degradação ambiental e carência de serviços básicos (habitação, água, saneamento, energia, estradas, entre outros). Para ouvir a voz dos jovens, o Banco Mundial, a Aliança de Cidades e o Governo da Noruega lançam o concurso internacional a respeito da questão urbana no mundo.
O concurso é aberto a jovens de 18 a 25 anos
A participação é individual
Os jovens participantes devem apresentar um texto de até 10 páginas (quatro mil palavras) junto com o resumo executivo de no máximo uma página (400 palavras), em Português, Inglês, Espanhol, Francês ou Árabe.
O texto deve responder a três perguntas: 1) Pense na cidade onde você mora. Quais são as maiores oportunidades e desafios para as pessoas que moram aí? 2) O que precisaria ser feito para transformar a sua cidade no lugar de seus sonhos? 3) Qual seria o seu papel, trabalhando junto com seus colegas, para construir a cidade de seus sonhos? (Tente ressaltar um ou dois aspectos que você tenha mencionado ao responder a pergunta 2)
É permitido enfocar iniciativas concretas das quais você tenha participado. Nesse caso, ao responder as três perguntas acima mencionadas, você pode especificar com quem o trabalho foi desenvolvido, os resultados alcançados, o caráter inovador da experiência e como você mediu o resultado do esforço. Além disso, olhando para o futuro: como você poderia expandir ou melhorar o impacto de seu trabalho? Como outros jovens podem replicar esta experiência? Se você não tiver uma experiência concreta, escreva como trabalharia com seus colegas para construir a cidade de seus sonhos.
Critérios de seleçãoQualidade das propostas, estrutura do texto, coerência dos argumentos, originalidade, criatividade, estilo, uso dos recursos e as evidências apresentadas que sustentam os argumentos.
Data limite para apresentar o texto23 de março de 2008
Os participantes devem acessar a página
www.essaycompetitio n.org para inscrever o seu texto on-line.
Anúncio dos finalistas30 de abril de 2008
Todos os finalistas (até nove no total) terão passagem e hospedagem pagas para apresentar o seu texto na Conferência Anual sobre Economia para o Desenvolvimento (ABCDE) a ser realizada pelo Banco Mundial na Cidade do Cabo, África do Sul, de 8 a 10 de junho de 2008. Durante a Conferência será escolhido o ganhador.
PrêmiosUS$ 5.000, (cinco mil dólares) para o primeiro colocado e US$ 1.000 (um mil dólares) para outros que se destacarem.
Mais informações sobre o concurso, os parceiros envolvidos e a composição do júri:
www.essaycompetitio n.org Para mais informações no Brasil: rbertolassi@ citiesalliance. org

segunda-feira, 3 de março de 2008

Renda e educação dos pais pesam mais do que cor em desigualdade racial na escola

Estudo afirma que, no acesso à educação, a origem social influencia mais do que a raça, embora peso da discriminação seja relevante
Leia o estudo
Toda a Desigualdade Socioeconômica entre os Grupos Raciais no Brasil é causada por Discriminação Racial?
TIAGO MALIda PrimaPagina
A desigualdade de acesso à educação entre negros e brancos no Brasil se deve mais à origem social do que à discriminação de cor. Entretanto, o preconceito também influencia a diferença. Essa é uma das conclusões de um estudo feito pelo
Centro de Internacional de Pobreza, uma instituição de pesquisa do PNUD, resultado de parceria com o IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas).
O texto, intitulado
Toda a Desigualdade Socioeconômica entre os Grupos Raciais no Brasil é causada por Discriminação Racial?, do economista Rafael Guerreiro Osório, faz uma análise detalhada da evolução educacional dos brasileiros nascidos de 1973 a 1977, tendo como base diferentes edições da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, feita pelo IBGE).
O economista acompanhou, por meio das amostras de 1982, 1987, 1992, 1996 e 2005, o acesso da população à educação. Ele dividiu os grupos de acordo com a instrução do chefe da família, a renda familiar e a cor da pele e verificou, por exemplo, a porcentagem de crianças nascidas entre 1973 e 1977 que chegaram aos estavam alfabetizadas em 1982, estavam no ensino médio em 1992 e na universidade em 1996. Para evitar distorções, o estudo controlou fatores que poderiam influenciar o resultado, como região, sexo e idade. A partir dos dados, foi criado um modelo estatístico pelo qual é possível estimar a influência de cada uma das variáveis (educação, renda e cor da pele) no resultado.
Nesse modelo, os fatores que influenciaram o sucesso educacional (chegar ao nível de escolarização indicado para a idade) são os socioeconômicos, mais do que a cor da pele. Por exemplo, a probabilidade de uma criança de 7 anos estar alfabetizada em 1982 cresce quando a educação do chefe de família e a renda da casa são maiores, independentemente de o aluno ser branco, preto ou pardo. A região também influencia, e a probabilidade cresce na seguinte ordem: Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul. Desse modo, a criança nascida na região Norte teria menos chances de estar alfabetizada, e a nascida no Sul, mais chances. Esse padrão de influência da educação dos pais e da renda se repete em todos os níveis analisados — ensino fundamental, ensino médio e superior.
O fato de a região e de a origem social serem mais relevantes que a discriminação por cor traz uma conclusão ruim, na opinião do autor do estudo. "Isso só mostra que o Brasil é um país com baixa mobilidade social e que o peso da origem social é grande. É muito difícil para alguém com renda baixa e cujos pais não tiveram acesso à educação conseguir atingir um nível educacional alto", afirma Osório. Para o especialista, isso pode explicar a manutenção dos negros entre os segmentos de renda mais baixos da sociedade e a perpetuação de uma desigualdade racial que vem dos tempos da escravidão.
Influência importante
Uma parte central do estudo analisa como se comporta a influência da discriminação por cor. A constatação de que o fato de ser negro faz, sim, diferença é sustentada pela observação de que pretos e pardos levam desvantagem em todos os indicadores de acesso à educação, mesmo quando a renda e a escolarização dos pais são iguais às dos brancos. Por exemplo, entre um negro e um branco nascidos entre 1973 e 1977 na região Norte, provenientes de famílias com o mesmo nível de renda e com os pais com o mesmo grau de instrução, eram maiores estatisticamente as chances de o branco estar na universidade em 1996.
Essa diferença em relação à cor é encontrada em maior ou menor escala em praticamente todos os cenários analisados. "A grande novidade que trazemos é conseguir medir onde a discriminação exerce maior influência para atingir a educação. E, nesse sentido, são justamente os negros de classe média que sofreram mais os efeitos negativos da discriminação na geração analisada", afirma Osório.
Para esse segmento da sociedade, ser negro estava relacionado a menor probabilidade de ter entrado na universidade em 1996. O estudo identificou um padrão: quanto maior a disputa por acesso ao ensino (poucas vagas e muitos em condição de concorrer a elas), mais a cor da pele influencia o sucesso educacional — sempre com desvantagem para pretos e pardos.
Nos domicílios de menor renda e menor instrução, a cor da pele faz pouca diferença na probabilidade de uma criança nascida entre 1973 e 1977 ter chegado à faculdade em 1996 — nessas condições, a chance é pequena tanto para pretos ou pardos quanto para brancos. Na outra ponta, quando negros e brancos estão entre o 1% mais rico da população, a influência da cor no acesso à universidade também é pequena: a probabilidade é alta para os dois grupos.
É, portanto, na camada intermediária que a cor pesa mais. Para uma pessoa que estivesse entre os 20% mais ricos do Brasil, nascida no Nordeste em uma família cujo chefe estudou até a quarta série do ensino fundamental, a influência da cor da pele no acesso à universidade é o dobro de uma pessoa com as mesmas características, mas que estivesse entre os mais pobres.
Do mesmo modo, quando havia mais disputa pelas classes de alfabetização, em 1982, ser branco ou negro fazia diferença — era menor a chance de um preto ou pardo estar alfabetizado. Já em 2005, a influência da cor da pele era pequena. O que aconteceu entre os dois períodos? O acesso à alfabetização foi universalizado: quase todos têm oportunidade de atingir esse nível educacional na idade certa. Isso significa, portanto, que, quanto maior o acesso à educação, menor os efeitos da discriminação por cor.
Cotas
Rafael Osório aproveita a conclusão para recuperar um assunto polêmico, não abordado no estudo: "Isso significa que universalizar a educação é melhor do que a política de cotas? Depende da urgência com que o Brasil quer tratar a questão. Dar oportunidade a todos para chegar à universidade realmente acabaria com a desigualdade racial nesse caso. Mas precisamos ver até onde isso é possível de ser feito e a urgência das pessoas que estão na idade de estudar. As cotas podem ser um bom instrumento para corrigir com rapidez essa desigualdade racial, motivada, entre outros motivos, também pela discriminação", afirma.